Mesmo em sistemas altamente automatizados, a intervenção manual continua sendo crucial para lidar com exceções, calibrar regras e evitar decisões erradas que afetem o negócio ou o cliente.
A adoção de tecnologias como machine learning e RPA revolucionou processos decisórios em áreas como crédito, compliance e prevenção à fraude. No entanto, decisões totalmente automatizadas podem ignorar nuances contextuais, gerar falsos positivos e comprometer a experiência do cliente. Por isso, o fator humano segue indispensável.
Para gerentes e tomadores de decisão, entender quando e como aplicar a intervenção manual é a chave para reduzir riscos, preservar a confiança do cliente e manter a governança dos sistemas automatizados.
A intervenção manual, nesse contexto, refere-se à capacidade de operadores ou especialistas revisarem, alterarem ou até anularem decisões feitas automaticamente por sistemas. Isso pode ocorrer em diferentes formas: como exceção tratada individualmente, auditoria posterior ou override direto de uma decisão. É esse controle humano que muitas vezes evita prejuízos operacionais ou reputacionais.
Por mais que a automação aumente a eficiência, quando engessada, ela pode falhar em interpretar contextos complexos, sinais contraditórios ou padrões fora do esperado, especialmente em ambientes como prevenção à fraude, onde o comportamento dos atacantes muda rapidamente. Nessas situações, a intervenção humana oferece flexibilidade, intuição e julgamento que os algoritmos ainda não conseguem replicar.
Automação sem supervisão pode gerar problemas significativos. Um sistema antifraude, por exemplo, que bloqueia automaticamente transações suspeitas pode, em períodos de pico (como datas comemorativas), rejeitar milhares de operações legítimas com base em padrões treinados em contextos normais. O resultado? Perda de receita, insatisfação de clientes e desgaste com parceiros.
Outro risco é o viés algorítmico. Modelos treinados com dados enviesados podem amplificar injustiças, como punir mais severamente determinados perfis de usuários. Sem intervenção humana para revisar esses resultados, a organização pode incorrer em práticas discriminatórias ou mesmo ilegais, em desacordo com marcos regulatórios como a LGPD ou princípios ESG.
Na prática, há situações onde a Brick identificou que a intervenção humana era não só desejável, mas essencial. Em um projeto com uma instituição financeira, um modelo automatizado de detecção de fraudes apresentava uma taxa elevada de falsos positivos: mais de 30% das transações bloqueadas eram, na verdade, legítimas.
A solução foi implementar um workflow híbrido: transações com score intermediário passaram a ser analisadas por especialistas humanos. O resultado foi a redução imediata do número de bloqueios incorretos e, ao mesmo tempo, a melhoria contínua do modelo, já que os dados da análise manual passaram a retroalimentar o sistema.
Esse tipo de aprendizado cíclico é um dos maiores ganhos quando se combina automação e supervisão humana com intencionalidade.
Para alcançar esse equilíbrio, é fundamental desenhar sistemas com pontos claros de intervenção humana. Uma boa prática é definir limiares de confiança nos scores de decisão: abaixo de certo valor, rejeita-se automaticamente; acima, aprova-se; e no meio, aciona-se uma análise manual. Outra abordagem é o uso de triggers contextuais, como comportamento atípico ou histórico inconsistente, que direcionam o caso a um analista.
Além disso, os sistemas devem ser pensados com mecanismos de feedback, permitindo que decisões manuais sejam incorporadas na evolução do modelo, promovendo aprendizado contínuo e governança sobre os critérios usados.
A gestão da intervenção manual também exige boas práticas operacionais. É importante monitorar indicadores como taxa de intervenção, tempo médio de análise e acurácia das decisões manuais. Esses dados ajudam a calibrar o ponto ótimo entre custo, risco e eficiência.
Outro ponto essencial é o treinamento das equipes. Analistas precisam entender o funcionamento básico dos modelos que estão supervisionando, os riscos envolvidos em suas decisões e os critérios que devem considerar. Sem isso, a intervenção humana pode se tornar aleatória ou até prejudicial.
Por fim, toda decisão manual relevante deve ser documentada, auditável e rastreável,garantindo que a organização mantenha controle e responsabilidade sobre suas operações.
A busca por automação total é tentadora, mas frequentemente baseada em mitos. Um dos mais comuns é acreditar que “quanto mais automático, melhor”. Isso ignora o custo dos erros que uma decisão incorreta pode gerar.
Outro mito é o de que “os modelos sempre acertam mais que humanos”. Na verdade, modelos são bons para padrões,humanos, para exceções. Quando usados juntos, geram mais valor.
E há ainda a ideia de que “intervenção humana atrasa o processo”. Em muitos casos, ela pode até tornar o sistema mais ágil ao reduzir retrabalho, perdas e conflitos com o cliente.
A intervenção manual não é um freio à automação, mas um componente estratégico dela. Em sistemas decisórios, especialmente os que impactam diretamente pessoas ou finanças, o bom senso humano pode ser a linha que separa a eficiência do erro grave.
Sua empresa tem os mecanismos certos para intervir nas decisões automatizadas ou está confiando demais no piloto automático?
Autor
Isadora Fritsch
Marketing e Planejamento
Publicado em
10 de jun. de 2025